Revista da Editora Manchete, Pais e Filhos!, completa um ano sem ter crianças negras na capa.
Só os brancos nascem?
Deixo estas imagens e algumas reflexões. Em um ano apenas de publicação, o que somente uma revista de maternagem e cuidado infantil foi capaz de semear? Não vejo bons frutos nisto.
(março de 2012)
Esta é edição deste mês de março, 2012, da Revista Pais & Filhos, Editora Manchete. Feita em São Paulo, tem circulação e renome nacional nesta área de cuidado infantil, ao lado da Revista Crescer. Fofinho, não? Aliás, todas as crianças são fofíssimas, despertando aquela vontade de encher de cheiro aquela bolinha rosa, loira e de olhos azuis. Ops...como assim? É, então, amig@s. Algo muito simples: para a Revista Pais & Filhos, só os brancos nascem, e preferencialmente os brancos loiros e de olhos claros. Só as crianças brancas são fofinhas. Num país em que @s negr@s são, pelo menos, 51% da população, nenhuma fofinha criança negra - nenhumazinha - recebeu espaço de capa da Pais & Filhos no tempo de um ano inteiro. Mostro a vocês aqui, retrospectivamente, as capas de março de 2012 a março de 2011 - 13 edições completamente brancas. Para um país 100% branco talvez - reforço, talvez - isso não fosse tão indecente.
(fevereiro de 2012)
Acontece que somos um país de maioria negra. Em alguns estados, a população negra é até pequena; em outros, predominante. Negras e negros de várias tonalidades, vários tipos corporais, diversas etnicidades; cabelo pixaim, enrolado, misturado, nariz mais largo ou mais fino, negritudes diversas que no entanto são reconhecidas socialmente pela sua matriz africana e toda a história que comporta o corpo negro. Essa história indesejável, para a matriz europeia, tem sido constantemente relegada ao esquecimento das páginas escritas - mas não é esquecida de nenhum modo: porque, se não nas páginas dos historiadores clássicos, no corpo das pessoas que a carrega. Por isso o corpo d@ negr@ é tão negado, invisibilizado. Porque conta uma história indesejável a uma ideologia hegemonicamente branca.
(janeiro de 2012).
E se tem algo que a história negra carrega é acerca do fundamento da família. A família, nos sentidos afro-brasileiros (assim como nos povos nativos), é quem sustenta, congrega, fortalece, permite existir e resistir. A mãe que conduz os filhos, pelejando duramente para garantir suas vidas neste mundo sob leis humanas tão desumanas, é a mulher negra que centraliza a força da casa, do terreiro, da comunidade. Se não é mãe de sangue, é mãe-madrinha, mãe-de-santo, mãe-vó. A família, para os povos negros, tem a força da origem e da continuidade. É o espaço em si de guarnição - espiritual e social. Daí que se formam quilombos: numa casa ou numa rua, mães, tias, avós, irmãos, primos e primas se aquilombam, sem a classificação dicotômica de "família nuclear" e "família extensa", comum à família da cultura burguesa.
(edições de dezembro a setembro de 2011)
Por que não temos imagens de crianças negras em um ano de edições da Revista Pais & Filhos. Porque pais, mães e filhos e filhas negr@s não interessam à revista. Ela simplesmente assume o padrão racista do que branco desejável, negando terminantemente a negritude brasileira. O maior problema dessa postura racista é que perpetua a negação da família negra aos olhos da sociedade em geral. Primeiramente, impõe uma imagem familiar que exclui os pais e filhos negros; nega, portanto, às mães negras (porque às mães é destinada a revista, apesar do título) se sentirem parte de uma dimensão materna - o cuidado infantil. Consequentemente, nega aos bebês negros o direito de pertencerem a este universo dos anjinhos, dos serezinhos que devem receber cuidados e mimos especiais.
(edições de agosto a abril de 2011)
texto: Rebeca Oliveira Duarte
http://observatoriodoracismovirtual.blogspot.com.br/
quarta-feira, 19 de setembro de 2012
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário